Cardiopatia Congênita: Como Conseguir Cirurgia para Gratuitamente pelo SUS
Guia completo sobre cardiopatias congênitas, diagnóstico precoce, tratamento cirúrgico e como acessar os serviços especializados do SUS para crianças com problemas cardíacos.


Cardiopatias Congênitas: Tratamento Cirúrgico pelo SUS
As cardiopatias congênitas são malformações na estrutura ou na função do coração que surgem durante o desenvolvimento fetal. Segundo o Ministério da Saúde, cerca de 30 mil crianças nascem com algum tipo de cardiopatia congênita por ano no Brasil, e aproximadamente 40% delas (cerca de 12 mil) necessitarão de cirurgia ainda no primeiro ano de vida.
Essa condição está entre as malformações que mais causam mortes na infância e é a terceira causa de óbito no período neonatal (primeiros 28 dias após o parto). Por isso, o diagnóstico precoce e o acesso ao tratamento adequado são fundamentais para garantir a sobrevivência e qualidade de vida dessas crianças.
Neste artigo, você vai descobrir como funciona o tratamento cirúrgico para cardiopatias congênitas pelo Sistema Único de Saúde (SUS), quais são os centros de referência, os critérios para cirurgia e o passo a passo para acessar esse serviço gratuitamente. Também explicaremos seus direitos garantidos por lei e como preparar seu filho para o procedimento.
O que são Cardiopatias Congênitas?
As cardiopatias congênitas são um conjunto de malformações na estrutura ou na função do coração que surgem durante o desenvolvimento fetal. Essas alterações podem afetar as paredes do coração, as válvulas cardíacas ou os vasos sanguíneos próximos ao coração.
A cada mil bebês nascidos, aproximadamente 10 apresentam algum tipo de cardiopatia congênita. Essas condições podem ser classificadas em:
Cardiopatias leves: Podem evoluir para resolução espontânea, como ocorre em alguns casos de comunicação interventricular (CIV)
Cardiopatias moderadas: Necessitam de tratamento medicamentoso e acompanhamento regular
Cardiopatias graves: Requerem intervenção cirúrgica ou procedimentos específicos, como as cardiopatias cianóticas (que causam coloração azulada na pele)
Principais Tipos de Cardiopatias Congênitas
Existem diversos tipos de cardiopatias congênitas, entre os mais comuns estão:
Comunicação Interventricular (CIV): Abertura na parede que separa os ventrículos do coração
Comunicação Interatrial (CIA): Abertura na parede que separa os átrios do coração
Persistência do Canal Arterial (PCA): Quando um vaso que deve se fechar após o nascimento permanece aberto
Tetralogia de Fallot: Combinação de quatro defeitos cardíacos que resultam em sangue pouco oxigenado bombeado para o corpo
Transposição das Grandes Artérias: As duas principais artérias que saem do coração estão conectadas ao contrário
Coarctação da Aorta: Estreitamento da artéria aorta
Diagnóstico das Cardiopatias Congênitas
O diagnóstico das cardiopatias congênitas pode ocorrer em diferentes momentos:
Diagnóstico Pré-natal
Durante a gestação, é possível identificar algumas cardiopatias através do ultrassom morfológico e do ecocardiograma fetal, geralmente realizados entre a 18ª e 24ª semana de gestação. O SUS oferece esses exames para gestantes de alto risco.
Teste do Coraçãozinho
Após o nascimento, todos os bebês devem realizar o Teste do Coraçãozinho (oximetria de pulso), que é obrigatório nas maternidades brasileiras. Este teste simples e indolor mede os níveis de oxigênio no sangue e pode detectar cardiopatias graves.
Sinais e Sintomas
Alguns sinais que podem indicar cardiopatia congênita em bebês e crianças incluem:
Coloração azulada da pele, lábios e unhas (cianose)
Dificuldade para respirar ou respiração acelerada
Cansaço excessivo, especialmente durante a amamentação
Baixo ganho de peso
Sudorese excessiva
Inchaço nas pernas, abdômen ou ao redor dos olhos
Sopro cardíaco detectado pelo pediatra
Se você observar qualquer um desses sinais em seu filho, procure atendimento médico imediatamente.
Tratamento Cirúrgico pelo SUS
O tratamento das cardiopatias congênitas varia conforme o tipo e a gravidade da malformação. Em muitos casos, a cirurgia cardíaca é necessária para corrigir o defeito e permitir que o coração funcione adequadamente.
Tipos de Intervenções Cirúrgicas
O SUS oferece diferentes tipos de procedimentos para o tratamento das cardiopatias congênitas:
Cirurgia cardíaca convencional: Procedimento aberto que corrige diretamente a malformação
Cateterismo intervencionista: Procedimento menos invasivo, realizado através da inserção de cateteres pelos vasos sanguíneos
Cirurgias paliativas: Em casos complexos, podem ser necessárias várias cirurgias em etapas
Transplante cardíaco: Em casos extremos, quando não há possibilidade de correção do defeito
Programa Renasce: Ampliando o Acesso ao Tratamento
Em 2021, o Ministério da Saúde lançou o Programa Renasce (Rede Nacional de Serviços de Cardiologia Pediátrica), com o objetivo de ampliar o acesso ao diagnóstico e tratamento das cardiopatias congênitas no SUS.
O programa prevê:
Ampliação da rede de atendimento especializado
Qualificação dos profissionais de saúde
Aumento do número de cirurgias cardíacas pediátricas
Redução do tempo de espera para procedimentos
Melhoria no acompanhamento pós-operatório
Centros de Referência
O SUS conta com centros de referência em cardiologia pediátrica distribuídos pelo país. Alguns dos principais são:
Instituto do Coração (InCor) - São Paulo/SP
Instituto Nacional de Cardiologia (INC) - Rio de Janeiro/RJ
Instituto de Medicina Integral Prof. Fernando Figueira (IMIP) - Recife/PE
Hospital da Criança de Brasília José Alencar - Brasília/DF
Hospital Pequeno Príncipe - Curitiba/PR
Hospital da Criança Santo Antônio - Porto Alegre/RS
Além desses, existem diversos hospitais habilitados para cirurgia cardíaca pediátrica em todas as regiões do país.
Como Conseguir Cirurgia Cardíaca pelo SUS: Passo a Passo
Se seu filho foi diagnosticado com cardiopatia congênita e necessita de cirurgia, siga estes passos para acessar o tratamento pelo SUS:
1. Consulta na Unidade Básica de Saúde (UBS)
O primeiro passo é procurar a UBS mais próxima da sua residência. Leve a criança para uma consulta com o pediatra ou médico da família, que fará uma avaliação inicial e, se necessário, encaminhará para um cardiologista pediátrico.
2. Consulta com Cardiologista Pediátrico
O cardiologista pediátrico realizará exames específicos, como:
Ecocardiograma
Eletrocardiograma
Radiografia de tórax
Outros exames complementares, se necessário
Com base nos resultados, o especialista confirmará a necessidade de cirurgia e fará o encaminhamento para um centro de referência em cirurgia cardíaca pediátrica.
3. Documentos Necessários
Para o encaminhamento, você precisará de:
Cartão do SUS da criança
Documento de identidade da criança (certidão de nascimento ou RG)
Documento de identidade do responsável
Comprovante de residência
Relatórios médicos e resultados de exames
Formulário de referência e contrarreferência preenchido pelo médico
4. Regulação e Agendamento
O encaminhamento será inserido no sistema de regulação do SUS. Dependendo da urgência do caso, a criança poderá:
Ser encaminhada imediatamente para um centro de referência, em casos graves
Entrar na fila de espera para cirurgia eletiva, com prioridade conforme a gravidade
É importante manter seus dados de contato atualizados na UBS para que você possa ser localizado quando a cirurgia for agendada.
5. Avaliação Pré-operatória
Antes da cirurgia, a criança passará por uma avaliação pré-operatória completa, que pode incluir:
Novos exames de imagem
Exames laboratoriais
Avaliação com anestesista
Consultas com outros especialistas, se necessário
6. Internação e Cirurgia
Na data agendada, a criança será internada para a realização da cirurgia. O tempo de internação varia conforme o procedimento e pode incluir:
Período em UTI pediátrica ou neonatal
Recuperação em enfermaria
7. Acompanhamento Pós-operatório
Após a alta hospitalar, a criança continuará sendo acompanhada por:
Cardiologista pediátrico
Equipe multidisciplinar (fisioterapeuta, nutricionista, psicólogo, etc.)
Pediatra na UBS
Tempo de Espera e Prioridades
O tempo de espera para cirurgia cardíaca pediátrica pelo SUS varia conforme:
A gravidade do caso
A região do país
A disponibilidade de vagas nos centros especializados
Casos urgentes e emergenciais têm prioridade absoluta. Para cardiopatias graves em recém-nascidos, o atendimento deve ser imediato.
Para cirurgias eletivas, o tempo médio de espera pode variar de 3 meses a 1 ano, dependendo da região e da complexidade do caso.
Preparação para a Cirurgia
O que Levar para o Hospital
Quando for internada para a cirurgia, a criança precisará de:
Documentos pessoais e do responsável
Cartão do SUS
Exames e relatórios médicos
Roupas confortáveis
Itens de higiene pessoal
Brinquedos ou objetos de apego (para crianças maiores)
Direito a Acompanhante
De acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente, toda criança internada tem direito a um acompanhante em tempo integral. O hospital deve oferecer condições para a permanência do acompanhante, como cadeira reclinável ou poltrona.
Recuperação e Cuidados Pós-operatórios
A recuperação após uma cirurgia cardíaca varia conforme o tipo de procedimento e a condição geral da criança. Em geral, envolve:
Fase Hospitalar
UTI: 2 a 7 dias, dependendo da complexidade da cirurgia
Enfermaria: 3 a 14 dias adicionais
Cuidados em Casa
Após a alta hospitalar, alguns cuidados são necessários:
Medicações: Seguir rigorosamente a prescrição médica
Cuidados com a incisão cirúrgica: Manter limpa e seca
Alimentação: Seguir as orientações nutricionais
Atividade física: Respeitar as limitações temporárias
Sinais de alerta: Ficar atento a febre, vermelhidão na incisão, dificuldade respiratória ou alterações no comportamento
Retorno às Consultas
É fundamental comparecer a todas as consultas de acompanhamento agendadas. O calendário típico inclui:
Primeira consulta: 7 a 14 dias após a alta
Consultas subsequentes: mensais ou trimestrais, conforme a evolução
Exames periódicos: ecocardiograma e outros, conforme necessidade
Possíveis Complicações e Quando Buscar Ajuda
Após a cirurgia, fique atento aos seguintes sinais que podem indicar complicações:
Febre acima de 38°C
Vermelhidão, inchaço ou secreção na incisão cirúrgica
Dificuldade para respirar ou respiração acelerada
Coloração azulada nos lábios ou pele
Batimentos cardíacos acelerados ou irregulares
Dor no peito
Perda de apetite ou recusa alimentar
Irritabilidade excessiva ou sonolência anormal
Se observar qualquer um desses sinais, procure atendimento médico imediatamente.
Direitos do Paciente com Cardiopatia Congênita
Crianças com cardiopatia congênita têm direitos garantidos por lei, incluindo:
Benefício de Prestação Continuada (BPC)
Famílias de baixa renda com crianças com cardiopatias graves podem solicitar o BPC, um benefício mensal de um salário mínimo. Para isso, é necessário:
Comprovar renda familiar per capita inferior a 1/4 do salário mínimo
Apresentar laudo médico detalhando a condição
Passar por avaliação médica e social do INSS
Tratamento Fora de Domicílio (TFD)
Se não houver tratamento adequado na cidade de residência, a família tem direito ao TFD, que pode incluir:
Transporte para o local de tratamento
Ajuda de custo para alimentação e hospedagem
Passagens para acompanhante
Educação Inclusiva
Crianças com cardiopatias têm direito a:
Matrícula em escola regular
Adaptações necessárias para suas limitações
Atendimento educacional especializado, quando necessário
Prioridade no Atendimento
Pacientes com cardiopatias graves têm direito a atendimento prioritário em serviços públicos e privados.
O que Fazer em Caso de Demora Excessiva
Se você enfrentar demora excessiva para conseguir a cirurgia ou tratamento pelo SUS, pode recorrer a:
Ouvidoria do SUS: Ligue para o número 136
Secretaria Municipal ou Estadual de Saúde: Procure o setor de regulação
Defensoria Pública: Busque assistência jurídica gratuita
Ministério Público: Faça uma denúncia formal
Associações de apoio a pacientes com cardiopatias: Busque orientação e suporte
Perguntas Frequentes
Todas as cardiopatias congênitas precisam de cirurgia?
Não. Algumas cardiopatias leves podem se resolver espontaneamente ou ser tratadas apenas com medicamentos. A necessidade de cirurgia depende do tipo e da gravidade da malformação.
Qual a taxa de sucesso das cirurgias cardíacas pediátricas?
As taxas de sucesso variam conforme o tipo de cardiopatia, mas em geral são bastante elevadas, entre 85% e 95% para a maioria dos procedimentos realizados em centros especializados.
Meu filho precisará de mais de uma cirurgia?
Em alguns casos, especialmente em cardiopatias complexas, podem ser necessárias múltiplas cirurgias ao longo da vida. O cardiologista pediátrico poderá informar sobre o plano de tratamento específico para cada caso.
Após a cirurgia, meu filho poderá levar uma vida normal?
A maioria das crianças que passa por cirurgia cardíaca consegue levar uma vida normal ou próxima do normal. Algumas podem ter certas limitações ou necessitar de cuidados especiais, mas com acompanhamento adequado, a qualidade de vida tende a ser muito boa.
O SUS cobre todos os custos do tratamento?
Sim, o SUS cobre integralmente os custos relacionados ao diagnóstico, cirurgia, internação, medicamentos durante a hospitalização e acompanhamento pós-operatório.
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Referências
Ministério da Saúde. Programa Renasce - Rede Nacional de Serviços de Cardiologia Pediátrica. 2021.
Sociedade Brasileira de Cardiologia. Diretrizes para o Diagnóstico e Tratamento das Cardiopatias Congênitas. 2022.
Instituto Nacional de Cardiologia (INC). Protocolos de Atendimento em Cardiopatias Congênitas. 2023.
DATASUS. Estatísticas de Cirurgias Cardíacas Pediátricas no SUS. 2023.